Um dia dessa semana eu cheguei em casa e tinha uma criança
brincando na rua, um loirinho andando de bicicleta sozinho, já deve ter uns 3
anos. Sorri com a cabeça pendendo para a esquerda enquanto o via pedalar com
pressa, olhando um pouco pra frente, um pouco para o lado, admirando e
desconfiando da plateia. Ele largou a bicicleta no meio da rua e voltou
andando, de um jeito gozado que me fez lembrar que eu já estive no lugar dele.
Com pouco mais de idade, eu brincava junto com a sua mãe
naquela mesma rua. Não da mesma coisa porque nunca soube muito bem andar de
bicicleta. Mas brinquei e briguei durante muitos anos naquela travessa sem saída,
tranquila naquela época, sem o prédio que hoje ocupa o terreno que “na minha
época” abrigava dois ou três galpões abandonados que invadíamos para empinar
pipa e roubar amora. Também não tinha o condomínio que hoje fica no lugar da
casa da minha avó e da vizinha, uma amiga, com quem conversava através de um
cano na parede quando ficava de castigo.
A rua já não é mais a mesma, parece que ficou apressada,
parece que perdeu a paciência com que aceitava as crianças entrando na casa de
vizinhos idosos e bravos pra se camuflar na noite durante o esconde-esconde.
Parece que ela envelheceu junto com a gente e hoje sente dores e desânimo
quando uma criança pede pra brincar com ela.
Lembrei do primeiro selinho em uma brincadeira de
verdade-ou-desafio, de quando soltei um pum na frente de todo mundo, de quando
cai pra trás e estava de saia quando brincávamos de “Pézinho” (PRIMEIRO –
ZERINHO!), lembrei de cantar música brega e conhecer Legião Urbana, de ver
vizinhos mudando e voltando ou só trocando de casa, de fazer aniversário de
bonecas, de gastar um filme inteiro de 36 poses no aniversário da boneca, de
quando a menina mais velha nos contou que tinha menstruado e por isso não ia
tomar sorvete, lembrei de quando não lavei minhas calcinhas e minha mãe as
colocou em um balde lá no portão porque eu não entrava de jeito nenhum, lembrei
que queria ser estilista e estudar em Paris, lembrei de quando caí de patins e cortei
a perna e parecia que estava tendo uma edição do Lollapalooza na minha casa de
tanta gente que juntou lá, da primeira vez que lavei um chão de cozinha quando
fui chamar uma amiga pra brincar depois do almoço e fui ajudar pra ir logo, lembrei
de quando um menino me disse que em mais
3 primaveras ele me procuraria, não sabia o que isso significava, assim como
não sabia o que diziam as músicas dos Mamonas que os meninos dublavam quando
fazíamos um “show” em casa e uma vez foi tão engraçado que um deles fez xixi
nas calças! Lembrei que eu tinha planos e sonhos pra uma vida inteira, mas não
lembro quais eram.
Passaram muito mais que 3 primaveras, o menino nunca me
procurou (ufa) e parece que toda essa história é de um outro alguém, mas não
minha! A gente cresce e parece que só lembra de ser adulto. Em um mês faz 10
anos que tirei minha carteira de motorista, em dois anos, faço 3 décadas de
vida e não me dá medo, nem arrependimento! Aproveitei bem cada fase da minha
vida, brinquei de Barbie até uns 14 anos, não queria que essa fase passasse.
Mas passou e parece que ficou muito distante! E hoje sou impaciente como a rua
que moro, na segunda-feira já espero pela sexta e na sexta já lamento porque em
3 dias será segunda novamente.
Nessa onda de eventos do Facebook (a qual eu não quero que
passe jamais), participei de um que dizia ser um Manifesto Para Sair Com a
Roupa Amassada Pois A Vida Passa E A Gente Nem Vê! Depois de rir, de rir
bastante, pensei que é verdade! Ela passa! E se a gente vive esperando pelo próximo
dia, ele não chega nunca!
Uma vez li uma frase bacana que era “A criança que você era teria
orgulho de você hoje?”. A minha, primeiro me zuaria por ter ficado gorda e acho
que pediria pra ir com mais calma, na comida e na vida! E perguntaria por que
agora eu tenho TV no quarto, se eu ainda sei fazer embaixada, por que antes eu
ia até o metrô Tiradentes a pé e agora vou de carro até a rua de cima e onde
está todo mundo que cresceu com ela. Só sei responder às três primeiras com
precisão.